Receptividade
Se for verdade que as ideias criadoras não podem ser forçadas, também é certo que elas não surgem se não lhes somos receptivos.
Muitas
ideias perdem-se simplesmente porque a pessoa se acha tão ocupada que
nem consegue nota-la ou percebe-lhe a significação. A
imaginação não é confinada por programas, mas atira suas ideias ao
consciente, a todo instante do dia ou da noite. Certo é que quando não
nos damos conta de uma ideia, pode ela retornar muitas vezes sob forma
um tanto diferente. Mas isto não acontece sempre,
nem somos sempre capazes de recapturar a intuição em sua forma
original. Devemos, por isso, atender as nossas ideias com Maximo
cuidado, especialmente na fase de incubação, quando é provável que
estejamos pensando em outra coisa. Muitas pessoas costumam registrar em caderno os pensamentos casuais. Geraram Manley Hopkins e Alfred Lor Tennyson, entre outros, escreviam diários em que anotavam intuições e observações que talvez servissem de sementes a futuros poemas.
IMENSÃO
Como
já tratamos disto, lembramos apenas que a imersão da pessoa em seu
assunto acarreta muitas vantagens. Nutre de ideias a imaginação;
robustece a mão do criador, oferecendo-lhe uma gama de abordagens em
relação ao problema; canaliza-lhe as energias, não necessariamente para
os velhos caminhos,
mas antes para novos e próprios, descerrando-lhe anteriores
aproximações; compele-o a pensar mais profundamente e de modo mais
global do que faria em outras circunstancia, a respeito de sua obra; e revela, nesta última, dificuldades que ele não teria notado sozinho.
DEDICAÇÃO E DESPRENDIMENTO
A
imersão implica dedicação. O criador precisa estar apaixonadamente
empenhado em seu trabalho, para reunir a energia necessária á longa e
prolongada concentração do pensamento criador. Ao focaliza exageradamente sua tarefa, pode estreitar o próprio pensamento e prejudicar a criatividade.
Por isso ele há de encontrar-se de tal modo desprendido que consiga ver
a obra como um todo, permitido que esta, por assim dizer, lhe fale por
si mesma. Embora ele deva verificar suas intuições objetivamente,
tem de dar-lhes primeiro uma justa oportunidade de manifestação. Como a
imaginação pode vir muitas vezes e não apenas uma,
durante o processo de revisão, o criador, alem de concentra-se em rever
previas intuições, há de dar à iluminação a possibilidade de retornar
sem obstáculos, quando tal acontece. Resumindo, o criador combinará
desprendimento como dedicação e saber quando cada um delas se torna adequada.
IMAGINAÇAO E JULGAMENTO
Na criação deve também existir paixão (imaginação) e decoro (julgamento). Por si só, a imaginação produzir idéias porem não as comunica; o julgamento, por si só, comunica idéias, mas não as gera. Não concorrera a criação, que é ao mesmo tempo produção e comunicação, sem que cooperem imaginação e julgamento.
INTERROGAÇÃO
Consiste a criatividade, segundo já dissemos, grandemente em rearranjar o que sabemos, a fim de achar
o que não sabemos. Em geral discutimos a ocorrência rara, não os fatos
que nos são familiares. Segue-se que, para pensar criativamente,
havemos de olhar de maneira nova o que normalmente consideramos
assentando. Um
dos obstáculos à investigação psicológica e, nas palavras de W.H.
Koestler, a “extrema familiaridade das experiências psicológicas... as
pessoas não tendem a fazer indagações a respeito de fatos que lhes
sejam profundamente conhecidos; indagam sobre eventos inusitados”
No pensamento criador e, pois, tão importante fazer perguntas como as responde. De fato, quando exprimimos como indagação o objeto de nossa pesquisas criadora, mais fácil se torna encontrá-lo.
Ao mesmo tempo, salvo se preparados para formular novamente nossas
perguntas, não é provável que pensemos além da primeira questão levantada. A. F. Osborn,
por exemplo, declara que a criatividade é ativada por “estocadas” como:
“E se ?... E daí...? Que mais...? Mais uma vez, que mais...?”. A imaginação é assim “bombardeada” por perguntas, algumas das quais pelo menos darão resultados frutíferos.
USO DE ERROS
Uma das características do pensamento criador são a amplitude e fertilidade de suas abordagens. Uma de suas marcas é
não aceitar o erro como final, mas como razão para mudar ou, uma vez
que o erro tantas vezes é verdade parcial, para modificar a abordagem.
O que perece erro pode na realidade ser uma intuição distorcida durante
a translação para o meio criador, ou quiçá uma intuição que, pelo
menos, caminha na direção correta. A pessoa criativa deve então tratar
seus erros com respeito, para ver aonde eles conduzem.
Também os acidentes não raro indicam o
caminho de uma resolução criativa. Por exemplo, um deslize do pincel
talvez constitua ponto de partida para uma pintura totalmente diversa.
Frequentemente o poeta se engana na leitura de seu próprio manuscrito, tomando uma palavra
por outra. Mais tarde percebera, talvez, a palavra que leu era aquela
que sua imaginação necessitava. O tradicional caos do rascunho do poeta
pode na verdade surtir o efeito de libertar-lhe a mente das associações
convencionais e permitir que as palavras estabeleçam suas próprias
conexões. Erros e acidentes servem, pois, muitas vezes, passam a indicadores da verdade, por serem tentativas do inconsciente para exprimir-se.
Em certo momento do processo criador, o produto criativo – seja pintura, poema ou teoria cientifica – ganha vida própria e transmite suas próprias necessidades ao criador. Permanecem afastada dele e convoca material de seus subconsciente. O criador, então,
precisa saber quando cessar de dirigir sua obra e permitir que ela o
dirija. Deve saber, em suma, quando é provável que sua obra seja mais
sábia do que ele.
Nesta seção dei a impressão, sem duvida, de descrever os processos de criação como se eles fossem independentes das qualidades do criador.Não o são, é claro. Voltemo-nos, portanto, ato para a pessoa e consideramos as peculiaridades com que a criação joga.
EXTRAIDO do livro ARTE E CIENCIA DA CRIATIVIDADE, de George F. Kneller, Brasa, SP, 1978
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